Consciência de classe

A consciência de classe é uma condição que retrata o pertencimento de um indivíduo a uma classe social e que, a partir disto, se mobiliza em torno da superação das estruturas de classe. Saiba mais!

A Consciência de classe está intrinsecamente ligada ao conceito de trabalho e às mudanças sociais ocorridas no mundo contemporâneo, originalmente proposto por Karl Marx. Além de caracterizar o pertencimento de um sujeito, direta ou indiretamente, a uma classe (categoria) social, a consciência de classe unifica um grupo de pessoas de modo a se organizarem politicamente em torno dos mesmos interesses e pautas. Nesse post, aprenda mais sobre o assunto!

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A história da consciência de classe

A Consciência de classe é um conceito que se assenta nas teorias políticas marxistas e só pode ser compreendido tendo como fundamento dois termos fundamentais: Estado e Luta de classes. Segundo o filósofo e sociólogo alemão Karl Marx, a consciência de classe é fruto da formação e luta histórica das classes sociais, apesar de ser totalmente distinta destas.

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Conforme a teoria marxista, a história desse conceito tão importante baseia-se no processo histórico dos conflitos entre as classes que ocuparam lugares e objetivos distintos na hierarquia social. O Estado, por exemplo, surge em meio aos conflitos de classes antagônicas para servir de aparelho de perpetuação de grupos e interesses dominantes no poder. A esse Estado, Marx compreende o Estado burguês enquanto instrumento de facilitação das relações de exploração

Por um lado, as classes se definem pelo lugar em que ocupam no processo de produção e, por outro, o trabalho define-se enquanto categoria fundante das relações humanas. Esses dois conceitos baseiam esse conceito historicamente.

Sendo assim, a consciência de classes nasce como uma espécie de condição de um ou mais indivíduos numa sociedade cuja dinâmica histórica é movida por uma luta de classes e interesses. Para Marx, essa condição é indispensável para que a classe explorada alcance a revolução proletária e supere o sistema de relações capitalistas.

Em sua gênese, a consciência de classe deve ser compreendida como uma consciência tipicamente revolucionária, que romperá efetivamente com as relações de produção capitalista. Há a necessidade de transformar a sociedade radicalmente de modo a superar a exploração das classes dominantes.

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Mas a manifestação dessa consciência não ocorre uniformemente e um exemplo disso são os momentos históricos em que é possível identificá-la: a revolução russa de 1917, a revolução cubana de 1959, dentre outras. São eventos históricos ocorridos em realidades distintas entre si; mas mesmo diante dessas diferenças, é possível perceber essa tomada de consciência.

Existir para si é historicamente o lema de uma classe que entende seu papel social no sistema capitalista. A formação dessa consciência, ao contrário do que se pensa, é fruto de um processo complexo ligado às relações de produção.

A importância deste conceito: condição indispensável para uma transformação

Para ambos os pensadores, somente por meio da tomada de consciência, as classes dominadas, no caso da modernidade, as classes trabalhadoras, poderiam superar tal luta e realizar a transformação da realidade social e histórica até o momento. Ou seja, a importância da consciência de classe consiste na capacidade desta desenvolver também uma consciência revolucionária e ativa na classe trabalhadora. Mas claro, esse desenvolvimento de consciência não ocorre naturalmente.

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Enquanto grupo dominado, a classe proletária passará a se compreender enquanto não só agente de transformação da realidade, mas como produtora da riqueza e da força social que sustenta o próprio sistema e as contradições intrínsecas a ele.

Mesmo sendo uma condição indispensável para a atuação de uma classe na sociedade, essa consciência desenvolve-se por meio da mobilização de dois fatores: a organização política popular por meio das coletividades (como os partidos, por exemplo) e através do desenvolvimento de uma solidariedade em torno dos mesmos interesses.

Ou seja, a importância da consciência de classe reside no entendimento de que é por meio da mobilização coletiva que se poderá alcançar mudanças nas dimensões da sociedade. Este conceito faz com que o indivíduo se perceba não mais como um indivíduo isolado, mas como um sujeito coletivo enquanto construtor de uma nova ordem social.

A consciência de classe para Marx

Na obra “O Manifesto do Partido Comunista” de 1848, os pensadores Karl Marx e Friedrich Engels realizam uma afirmação emblemática para sua época: “A história de todas as sociedades que existiram até hoje é a história de luta de classes. Homem livre e escravo, patrício e plebeu, barão e servo, mestres e companheiros, numa palavra, opressores e oprimidos, sempre estiveram em oposição uns aos outros”.

A Consciência de classe diz respeito ao ser e estar numa sociedade marcada por antagonismos e conflitos. É por meio dessa tomada de consciência que o trabalhador compreenderá o seu papel social histórico na estrutura capitalista, visando a superação das relações de exploração e submissão — frutos da luta de classes ao longo da história.

Como desenvolver consciência de classe

Perceber a força trabalhadora, isto é, a classe proletária no sistema capitalista, é compreendê-la como contradição no sistema social, pois além de fornecerem a força de trabalho e serem a parte primordial do capitalismo na construção de produtos e geração de valor desses mesmos produtos, essa classe não tem acesso às riquezas geradas em decorrência das vendas dos produtos produzidos.

Portanto, há grupos diferentes envolvidos num sistema de relações econômicas de modo de produção capitalistas marcadas por exploração, submissão e desigualdades.

Ou seja, há uma contradição social na existência dessa relação trabalhista. Mas como, por exemplo, um grupo de trabalhadores inseridos nesse sistema de conflitos podem desenvolver uma consciência de classe? Afinal, identificar essa contradição acima mencionada é suficiente para tal? Seria este conceito uma maneira como esses trabalhadores se percebem enquanto trabalhadores? A resposta é não, apesar desse processo fazer parte dessa tomada de consciência.

Marx vai além e se pergunta o real motivo da classe trabalhadora de sua época não se revoltar em nenhum momento contra o sistema de exploração em que está inserida; o pensador, e outros pensadores posteriormente, afirmam que essa revolta não ocorre pelo fato da classe trabalhadora ter sua mentalidade sujeita a uma estrutura política e ideológica dominada pela classe burguesa dominante. Há uma naturalização desse processo.

Segundo Marx, o desenvolvimento de uma consciência de classe se dá pela via daquilo que ele denomina classe para si. Em sua obra “A ideologia alemã”, o filósofo alemão explícita uma divisão importante para a real tomada de consciência de classe, sendo ela: a classe em si e a classe para si. E qual seriam as diferenças?

Classe em si e Classe para si

Em suma, os indivíduos só formam uma classe bem definida e localizada na hierarquia social quando estes assumem a consciência de sua condição (ser e estar) de dominação e exploração e, consequentemente, se engajam na luta comum contra a classe dominante.

Para o pensador essa definição é central para entender a “classe para si”, isto é, um grupo de trabalhadores reunidos na luta política efetiva dos próprios interesses.

Por outro lado, a “classe em si” nada mais é do que uma massa (formada de maneira espontânea nas relações de produção) constituída por finalidades comuns visando os seus interesses imediatos frente ao sistema capitalista, mesmo reconhecendo sua condição de exploração — percebe a diferença?!

Por mais que a classe em si busque modificações brandas nas relações capitalistas de produção, ela não provoca rupturas e mudanças profundas e efetivas não só no sistema, mas na sociedade em sua totalidade.

Para desenvolver uma consciência de classe é necessário ter o que Marx chama autoconsciência, ou seja, se enxergar enquanto pertencente a uma classe trabalhadora de modo a produzir ações práticas alinhadas com os objetivos da classe a qual pertence. Não basta apenas perceber as contradições nas relações de produção mencionadas anteriormente; se faz necessário compreender-se enquanto parte de um todo que busca a superação das relações capitalistas.

A consciência de classe no Brasil

Este conceito deve ser entendida conforme o tempo e lugar analisado, tendo em vista que ela é fruto de um processo complexo. No Brasil, não é diferente.

Conforme analisado, a consequência da formação de uma consciência de classe, é a constituição da classe trabalhadora enquanto uma classe para si, e não mais em si. Isto é, uma classe que se percebe não mais como uma massa, mas como um grupo com o potencial de transformar o mundo superando o sistema capitalista e a divisão de classes.

Nessa perspectiva, pode-se falar em consciência de classe no Brasil? A resposta é afirmativa. A estrutura econômica que orienta as relações de produção no Brasil é o capitalismo e, conforme afirma o filósofo alemão, Georg Lukács, o desenvolvimento de uma consciência de classe é um fenômeno possível apenas no capitalismo.

Outro ponto que aponta para a existência de uma consciência de classe no Brasil são as organizações políticas através das atividades dos partidos, sindicatos e grupos politicamente ativos na busca por seus interesses. Mas conforme mostram as principais pesquisas feitas sobre o tema, é possível identificar este conceito no Brasil através de momentos pontuais, apesar de não ser possível quantificar isso, na prática.

Há uma classe proletária no país, mas esse grande grupo de trabalhadores no sistema capitalista tem posições diversas a respeito de como eles próprios se veem diante do sistema.

Contudo, conforme aponta o sociólogo francês, Michael Lowy, o fenômeno de uma consciência de classe revolucionária pode ser identificado devido ao desenvolvimento, a longo prazo, da industrialização, da urbanização e da conjuntura econômica, social e política atual. Por fim, pode-se concluir que a existência crescente de uma classe para si no Brasil pode trazer importantes transformações na dinâmica social do país.

Consciência de classe X consciência social

Pontualmente, pode-se apontar a consciência social como o conhecimento de que uma pessoa tem de perceber as dimensões da realidade e sociedade que a cerca. Um sujeito que desenvolve uma consciência social tem uma percepção de como as ações repercutidas na sociedade podem ou não favorecer a vivência dos integrantes dessa mesma sociedade.

Geralmente, a consciência social baseia-se na ideia de que todo indivíduo é capaz de compreender as necessidades e condições do “outro” e fará o que for necessário para contribuir e sanar tais necessidades através dos mecanismos sociais. Sendo assim, a consciência social também pode ser pensada como ação social, visto que desenvolver tal consciência impulsiona, pelo menos em tese, o indivíduo a tomar ações em prol do seu próximo.

Já a consciência de classe está ligada a uma estrutura de classes sociais em conflito. Em teoria, essa consciência tomada por parte de um indivíduo da classe trabalhadora e proletária, através do sentimento de solidariedade e pertencimento a um grupo de pessoas que se encontram na mesma condição, superará a estrutura de classes e transformar a realidade social radicalmente.

Sendo assim, a maior diferença entre os dois conceitos está no fato de que a consciência social pode ser desenvolvida por toda e qualquer pessoa, enquanto a consciência de classe é restrita a um grupo de indivíduos trabalhares que compreender sua posição nas relações de produção capitalista e, mediante a isso, objetiva, através da organização política, superar o sistema capitalista.

5 frases sobre a consciência de classe

Como forma de entender este conceito através dos principais pensadores que formularam o tema, confira as citações abaixo:

  1. A história de todas as sociedades que existiram até hoje é a história de luta de classes. Homem livre e escravo, patrício e plebeu, barão e servo, mestres e companheiros, numa palavra, opressores e oprimidos, sempre estiveram em oposição uns aos outros. (Marx e Engels)
  2. Antes de tudo, o trabalho de um processo entre o homem e a natureza, um processo em que o homem, por sua própria ação, media, regula e controla sua troca material com a natureza. Ele mesmo se defronta com a matéria natural como uma força natural. Ele põe em movimento as forças naturais pertencentes à sua corporalidade, braços e pernas, cabeça e mão, a fim de apropriar-se da matéria natural numa forma útil para sua própria vida. (Karl Marx)
  3. a combatividade de uma classe é tanto maior quanto melhor for a consciência que ela puder ter na crença de sua própria vocação (Georg Lukács)
  4. Só quem assume a história de sua vida pode ver nela a realização de si mesmo. A responsabilidade de assumir o controle da própria biografia significa ter clareza sobre quem se quer ser. (Jurgen Habermas)
  5. Somos criadores de nós mesmos, da nossa vida, do nosso destino e nós queremos saber isto hoje, nas condições de hoje, da vida de hoje e não de uma vida qualquer e de um homem qualquer. (Antônio Gramsci)

Essas são citações que representam a forma como os principais pensadores do tema compreendem as dinâmicas sociais e econômicas no sistema capitalista e o papel social que a classe trabalhadora tem dentro desse mesmo sistema.

Vídeos sobre a Consciência de classe

Conforme estudado, conforme Marx e demais pensadores marxistas, a consciência de classe é uma condição indispensável para a realização de transformações efetivas e profundas numa sociedade capitalista baseada nas relações de produção marcada pela exploração e desigualdades. Tendo em vista isso, confira abaixo vídeos importantes para compreender melhor esse conceito.

Introdução ao conceito

Nesse vídeo, o pessoal do canal “Sem Classe” faz uma introdução muito explicativa e didática sobre o conceito de Consciência de classe e traz implicações sobre como esse conceito é aplicado na sociedade conforme foi idealizado por seus principais pensadores.

Novas interpretações da consciência de classe

Acima, confira a interpretação de um dos maiores pensadores marxistas já existentes, Georg Lukács.

Será que há consciência de classe no Brasil?

Nesse vídeo, você vai conferir, de maneira leve e séria, uma reflexão sobre a possibilidade da existência de uma consciência de classe no Brasil.

Se você chegou até aqui é porque conseguiu construir um entendimento sólido em torno desse tema. A sociologia contribui para que haja uma percepção crítica em torno dos dilemas em que a sociedade está inserida, sejam as relações de trabalho ou quaisquer outros temas. Conheça mais sobre os temas abordados pela sociologia estudando sobre a desigualdade social no Brasil?

Referências

Condição pós moderna; uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural (1993) — David Harvey;
O capital (2011) — Karl Marx;
A corrosão do caráter: consequências pessoais do trabalho no novo capitalismo (1999) — Richard Sennett;
O Manifesto do Partido comunista (1998) — Karl Marx;
Dicionário de Política (2008) — Noberto Bobbio;
Estrutura e Consciência de classe operária no Brasil (2018) — Michael Lowy.

Thiago Abercio
Por Thiago Abercio

Historiador e mentor educacional formado pela Universidade Federal de Pernambuco. Professor de História e de Repertório cultural e Ideias, redator e analista de conteúdo. Atualmente realiza pesquisas na área de História da arte e das mentalidades.

Como referenciar este conteúdo

Abercio, Thiago. Consciência de classe. Todo Estudo. Disponível em: https://www.todoestudo.com.br/sociologia/consciencia-de-classe. Acesso em: 20 de April de 2024.

Exercícios resolvidos

1. [Unimontes]

A questão das classes sociais ocupa um papel fundamental na teoria de Karl Marx. Para ele, existem condicionantes e determinantes na complexa relação entre indivíduo e sociedade e entre consciência e existência social. Considerando as reflexões de Karl Marx sobre esse tema, marque a alternativa INCORRETA.

a) As classes sociais sustentam-se em equilíbrios dinâmicos e solidários, sendo a produção da solidariedade social o resultado necessário à vida em sociedade.

b) A luta de classes desenvolve-se no modo de organizar o processo de trabalho e no modo de se apropriar do resultado do trabalho humano.

c) A luta de classes está presente em todas as ações dos trabalhadores quando lutam para diminuir a exploração e a dominação.

d) Em meio aos antagonismos e lutas sociais, o indivíduo pode repensar a realidade, reagir e até mesmo transformá-la, unindo-se a outros em movimentos sociais e políticos.

a) As classes sociais sustentam-se em equilíbrios dinâmicos e solidários, sendo a produção da solidariedade social o resultado necessário à vida em sociedade.

Segundo Marx, as classes não estão em equilíbrio, mas em constantes conflitos

2. [UEM]

Em termos sociológicos, assinale o que for correto sobre o conceito de classes sociais:

a) Sua utilização visa explicar as formas pelas quais as desigualdades se estruturam e se reproduzem nas sociedades.

b) De acordo com Karl Marx, as relações entre as classes sociais transformam-se ao longo da história conforme a dinâmica dos modos de produção.

c) As classes sociais, para Marx, definem-se, sobretudo, pelas relações de cooperação que se desenvolvem entre os diversos grupos envolvidos no sistema produtivo.

d) A formação de uma classe social, como os proletários, só se realiza na sua relação com a classe opositora, no caso do exemplo, a burguesia.

e) A afirmação “a história da humanidade é a história das lutas de classes” expressa a ideia de que as transformações sociais estão profundamente associadas às contradições existentes entre as classes.

e) A afirmação “a história da humanidade é a história das lutas de classes” expressa a ideia de que as transformações sociais estão profundamente associadas às contradições existentes entre as classes.

São os conflitos de interesses e de condição que move a história e as dinâmicas social, segundo Marx

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