Gripe Espanhola

Considerada a "Mãe das Pandemias", a Gripe Espanhola dizimou aproximadamente um terço da população mundial. Um evento que instabilizou as dinâmicas sociais no mundo inteiro.

Conhecida como a “Grande Gripe”, a Gripe Espanhola foi a pandemia mais mortal de todos os tempos. Inesperadamente, em 1918, a humanidade lidou com um determinado tipo de vírus, até então restrito apenas às aves, que passou por uma série de mutações e, assim, infectou os humanos. Seu impacto foi, sem dúvidas, catastrófico.

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O que foi a Gripe Espanhola

Em 1918, o mundo testemunhou o fim da Primeira Guerra e o início de uma batalha silenciosa: a Gripe Espanhola – como foi nomeada pelos jornais da época. A Espanha permaneceu “neutra” durante a Primeira Guerra, por isso, a imprensa possuía mais liberdade para noticiar sobre as doenças que assolavam diversos países. Apesar do nome, a gripe, na verdade, chegou à Europa em um navio proveniente dos Estados Unidos.

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A origem do vírus ainda é debatida entre os estudiosos da saúde e historiadores. Entretanto, há um consenso maior sobre o vírus ter surgido nos Estados Unidos, mais especificamente em um forte no Texas, que preparava soldados para a guerra. Muitos documentos foram escritos no local relatando as consequências de uma “gripe desconhecida”.

Conforme afirma um relatório do exército estadunidense: “[a gripe] tem provocado pneumonia fulminante, com hemorragia e edemas nos pulmões, fatal em um período de 24 a 48 horas”. Em ondas, a pandemia se alastrou pelo mundo. Nas palavras do historiador John M. Barry, “[…] em 1918, a humanidade estava ocupada demais lutando contra si mesma… o que a levou a enfrentar uma guerra mais letal”. O impacto foi catastrófico: mais de 50 milhões de pessoas morreram.

Em linhas gerais, pode-se afirmar que a Gripe Espanhola durou de fevereiro de 1918 até abril de 1920, quando houve uma amenização no número de infectados. Uma experiência do passado que, compreendida com um olhar histórico, mostra as limitações do ser humano e a força do imprevisível na História.

Difusão da Gripe Espanhola: a mãe das pandemias

A Gripe Espanhola, assim como muitas outras pandemias, aconteceu em ondas de contágio. Entre março de 1918 e maio de 1919, ocorreram 3 ondas, sendo que a segunda é considerada pelos pesquisadores como a mais fatal, devido a sua alta difusão e número de mortes. A seguir, entenda cada uma delas:

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Primeira onda

Na primavera do hemisfério norte, quantitativamente, a primeira onda matou poucas pessoas. A gripe foi mais grave na região de Haskell County, porém também afetou outros lugares. Um jornal de Haskell noticiou que “[…] Dean Nilson, Ernest Elliot e John Bottom, além de outros nomes não identificados” viajaram de Haskell para a região de Funston devido ao surto de uma “forte gripe”, na última semana de fevereiro”.

Segundo apontamentos históricos, tudo leva a crer que eles chegaram à Funston entre os dias 28 de fevereiro e 2 de março. Após dois dias, em 4 de março de 1918, o hospital da base militar da região começou a receber soldados acometidos pela gripe. Ao longo de 3 semanas, 1.100 solados em Funston precisaram ser hospitalizado de tão doentes que estavam.

Os militares da base de Funston circulavam em outras bases militares e, especialmente, eram enviados à França. Assim, inicia-se o feito dominó e a gripe eclode no mundo todo em questão de meses. Mesmo sendo muito contagiosa, essa primeira onda foi considerada benigna, pois houve poucas mortas.

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Segunda onda

A segunda onda pegou o mundo desprevenido, pois a doença parecia ter perdido força. Acredita-se que ela tenha surgido nas zonas portuárias de pelo menos três países: Estados Unidos (Boston), França (Brest) e Serra Leoa (Freetown). Provavelmente, sua difusão aconteceu por meio de transportes navais de tropas militares que transportavam o vírus desde os campos de batalha europeus até os bases hospitalares.

Foi nesse cenário que o vírus se difundiu para outros continentes, com exceção da Antártida e de locais isolados. Entre agosto e dezembro de 1918, a Gripe Espanhola dizimou milhares de pessoas. Próximo ao início de janeiro de 1919, houve um lento declínio nas taxas de mortes e contágios, visto que muitas pessoas pareciam ter desenvolvido uma imunidade natural contra o vírus.

Além disso, muitas medidas de prevenção e isolamento foram tomadas, como o uso de máscaras, o distanciamento social, a quarentena e o cancelamento de todo e qualquer evento que suscitasse aglomerações. Quando tudo parecia ir bem, houve uma terceira onda.

Terceira onda

Com o fim da Primeira Guerra Mundial e a volta dos soldados para seus países de origem, ocorreu a terceira onda de contágio, principalmente na Austrália. A pandemia já estava regulada no local, porém, com a volta dos soldados, houve uma nova difusão que se espalhou pelo hemisfério sul. Essa onda impacta um grande número de pessoas entre fevereiro e maio de 1919, em alguns locais até 1920.

Os historiadores afirmam que, apesar da Primeira Guerra Mundial não ter sido a principal causa da Gripe Espanhola, ela contribuiu para a difusão. As aglomerações nos quartéis e nas batalhas cooperaram significativamente na disseminação. Somado a isso, considera-se que a má higiene, más condições nutricionais e psicológicas, bem como os enfrentamentos tenham aumentado a susceptibilidade dos soldados ao vírus.

Como acabou a pandemia mais morta da história

Calcula-se que aproximadamente 1/3 da população mundial morreu durante a pandemia da Gripe Espanhola. Contudo, muitas medidas foram tomadas para conter o vírus. Segundo a historiadora María Lara Matínez, as medidas de isolamento foram as maiores armas para minimizar os impactos da pandemia. Com o advento da segunda onda, muitos governos decretaram o fechamento de espaços públicos e de convivência, como as escolas, fronteiras, teatros, dentre outros. Aos poucos, criou-se uma consciência em torno da questão sanitária básica, por exemplo, o hábito de lavar as mãos constantemente.

Os espaços eram desinfetados com frequência, muitos países decretaram a obrigatoriedade do uso de máscaras. O governo norte-americano chegou a multar em 100 dólares as pessoas que negavam andar de máscara durante a pandemia. Já em 1918, o isolamento, confinamento e quarentena severa foram postas em prática – medidas que se tornaram eficazes até hoje.

Devido ao conhecimento limitado da época, não foi possível desenvolver uma vacina tão rapidamente. Como forma de amenizar a disseminação, muitos profissionais de saúde prescreviam substâncias e procedimento que estavam disponíveis na época, como os laxantes, purgantes, enemas, extrato de vegetais, desinfetantes com iodo, arsênico, mercúrio, álcool e tabaco.

No geral, entende-se que o fim da pandemia ocorreu em 1920, quando a sociedade desenvolveu gradualmente uma imunidade coletiva ao vírus. Por fim, é importante destacar que o vírus não desapareceu, e continuou sofrendo mutações ao longo da história; um exemplo disso foi o vírus H1N1 (Gripe A), em 2009.

A gripe espanhola no Brasil

No Brasil, a pandemia chegou em 14 de setembro de 1918, espalhando-se rapidamente pelos grandes centros urbanos. Nesse período, estava em curso a segunda onda. Os primeiros brasileiros que adoeceram e morreram faziam parte das tripulações dos navios da Missão Médica Brasileira e da Divisão de Guerra que seguiam para frente de batalha na Europa.

Os estudiosos apontam que o vírus entrou no país por meio do navio Demerara, que havia saído da Inglaterra, passando por Portugal (Lisboa), atracando com doentes a bordo nas cidades de Recife, Salvador e Rio de Janeiro. A doença se espalhou rapidamente no país e as cidades do Rio de Janeiro e São Paulo foram as mais afetadas. Calcula-se que a Gripe Espanhola tenha causado de 35 mil a 300 mil mortes no Brasil.

A cidade de São Paulo registrou cerca de 6 mil mortes, já no Rio de Janeiro os números chegaram a 15 mil. A Gripe Espanhola matou, inclusive, o recém-reeleito presidente Francisco de Paula Rodrigues Alves, que faleceu sem assumir seu segundo mandato, em 16 de janeiro de 1919, em decorrência de complicações da virose.

Vídeos sobre a Mãe das Pandemias

A Gripe Espanhola é um assunto amplo, com muitos fatos históricos. Abaixo, confira alguns vídeos importantes que servirão para revisar e dar continuidade aos estudos.

A Gripe Espanhola e a origem do seu nome

Nesse vídeo, o historiador Felipe Figueiredo fala sobre a gripe espanhola, suas principais causas e explora o motivo da denominação “espanhola”, tendo em vista que ela não teve origem na Espanha.

Entre a Gripe Espanhola e a Covid-19

Confira o vídeo do historiador Eduardo Bueno sobre as principais características e semelhanças entre a Gripe Espanhola e a Covid-19, entendendo a razão da aparente repetição na história.

A Gripe Espanhola e seus impactos na vida humana

Nesse vídeo-ensaio, é analisado os desdobramentos que a Gripe Espanhola e a pandemia da Covid-19 tiveram na vida social. É destacado também o fenômeno da solidão que, segundo algumas pesquisas, aumentou durante essas pandemias.

Além da Gripe Espanhola e da Covid-19, que assolou o mundo recentemente, a história da humanidade é marcada por pandemias. Continue estudando sobre o assunto e saiba mais sobre a Peste Bubônica.

Referências

A Grande Gripe (2020) – John M. Barry
É hora de mudarmos de via: As lições do coronavírus (2020) – Edgar Morin
Memória médica: a Gripe Espanhola de 1918 (2020) – Paulo Murillo Neufeld

Thiago Abercio
Por Thiago Abercio

Historiador e mentor educacional formado pela Universidade Federal de Pernambuco. Professor de História e de Repertório cultural e Ideias, redator e analista de conteúdo. Atualmente realiza pesquisas na área de História da arte e das mentalidades.

Como referenciar este conteúdo

Abercio, Thiago. Gripe Espanhola. Todo Estudo. Disponível em: https://www.todoestudo.com.br/historia/gripe-espanhola. Acesso em: 28 de March de 2024.

Exercícios resolvidos

1. [UFRGS]

Em 1918, ocorreu no Brasil uma grande mortalidade entre a população do país, ocasionada pela epidemia de “gripe espanhola”. A respeito desse surto epidêmico, considere as afirmações abaixo.

I. A doença chegou ao Brasil com o afluxo de imigrantes vindos da Europa.
II. O cotidiano dos brasileiros foi profundamente alterado, com o fechamento de locais públicos e a proibição de reuniões noturnas.
III. Rodrigues Alves, eleito à Presidência da República em 1918, não pode tomar posse a 15 de novembro por estar acometido da “gripe espanhola”.

Quais estão corretas?

a) Apenas I.
b) Apenas II.
c) Apenas I e III.
d) Apenas II e III.
e) I, II e III.

e) I, II e III.

A Gripe Espanhola impactou fortemente o cotidiano social e a mentalidade dos indivíduos. Outro fator de relevância nacional foi a morte do presidente recém-eleito, Rodrigo Alves. Esses fatos evidenciaram a natureza cruel da pandemia.

2. [UEMG]

Leia atentamente o texto e, a seguir, responda:
“Mas o número de gripados aumentou rapidamente nas semanas seguintes e outras medidas médico-governamentais foram tomadas na tentativa de minimizar a propagação epidêmica. Escolas, internatos, cinemas, teatros, e vários outros lugares e de reunião pública cerraram suas portas. As igrejas diminuíram drasticamente suas atividades. Práticas cotidianas, como beijos e abraços ou as compras nos mercados por mais de uma pessoa de uma mesma família, foram desaconselhadas (era necessário diminuir a quantidade de indivíduos circulando e assim o contato/contágio). A vida da cidade foi parando.” Liane Maria Bertucci-Martins. Fragmentos do discurso científico na gripe espanhola. Texto integrante dos Anais do XVII Encontro Regional de História – O lugar da História. ANPUH/SPUNICAMP. Campinas, 6 a 10 de setembro de 2004. Cd-rom.

A gripe de 1918, também conhecida como gripe espanhola, tornou-se uma pandemia no segundo semestre daquele ano. No Brasil, foram registradas cerca de 300 mil mortes. Dentre as vítimas ilustres da doença, o presidente Rodrigues Alves e a educadora Anália Franco. Na década de 1910, algumas transformações sociais possibilitaram a formação de condições ideais para a propagação da doença.

Assinale, a seguir, o processo histórico que NÃO está relacionado com a propagação da gripe espanhola, no Brasil:

a) As cidades brasileiras do Sudeste no início da década de 10 tiveram um forte período de crescimento, sem, no entanto, implementar reformas urbanas estruturais, dificultando a prevenção da doença entre os mais pobres.
b) Com o incremento da produção de café, vários grupos financeiros expandiram suas atividades econômicas nas cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo, provocando um forte empobrecimento, expandindo o número de contaminados no meio rural.
c) O processo de urbanização acelerado pela implantação das primeiras fábricas de produtos têxteis e alimentícios no Brasil concentrou várias famílias de trabalhadores em cortiços e moradias insalubres.
d) Os trabalhadores das fábricas eram contratados num regime assalariado de baixa renda, incompatível com as nascentes necessidades da vida urbana.

b) Com o incremento da produção de café, vários grupos financeiros expandiram suas atividades econômicas nas cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo, provocando um forte empobrecimento, expandindo o número de contaminados no meio rural.

Um dos meios de grande contaminação e difusão do vírus foram os meios de cultivo, visto que, no início do século XX, o Brasil vivenciava um pequeno desenvolvimento no quesito agrícola, especialmente com o cultivo do café. Isso, sem dúvida, cooperou para a difusão do vírus.

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