Cora Coralina

Cora Coralina é um dos destaques do movimento modernista. A autora rompeu barreiras estéticas e criou uma literatura que abordou o cotidiano e deu voz aos marginalizados.

Cora Coralina é nacionalmente conhecida como uma das maiores poetas e contadora de histórias que viveu no século XX. Contemporânea ao movimento modernista, configurou uma ruptura no modelo artístico poético até então vigente. Neste texto, você conhecerá sobre a autora e suas principais obras.

Publicidade

Biografia de Cora Coralina

Cora Coralina
Cora Coralina. Fonte: TC Online.

Escritora, poeta e contista, Ana Lins dos Guimarães Peixoto Bretas, mais conhecida pelo pseudônimo de Cora Coralina, nasceu no dia 20 de agosto de 1889 em Villa Boa, Goiás. Filha do desembargador Francisco de Paula Lins dos Guimarães Peixoto e de Jacinta Luísa Couto Brandão. Durante a infância, a autora viveu com os pais na casa da família, comprada ainda no século XIX, paisagem que viria a ser retomada em suas obras.

Relacionadas

Carlos Drummond de Andrade
Mundo mundo vasto mundo. E agora, José? Conheça a vida e obra de Drummond, um dos maiores poetas brasileiros.
Escolas Literárias
Escolas Literárias são formas de dividir a literatura, bem como os autores, em diferentes categorias segundo suas características em comum.
Geração de 45
A Geração de 45 foi marcada por grandes autores em um contexto pós-guerra do Modernismo.

Cora Coralina frequentou apenas os primeiros quatro anos escolares com a Mestra Silvina, quem a autora considera a responsável pelo seu aprendizado. Apesar dos poucos anos de escolaridade e das dificuldades de aprendizagem, Ana Bretas já escrevia e se dedicava à literatura desde os 14 anos e, aos 15, adotou o pseudônimo de Cora Coralina. Seu primeiro conto, Tragédia na roça, foi publicado no Anuário Histórico e Geográfico do Estado de Goiás. A escritora também publicou em jornais de outras cidades como o Folha do Sul e a revista A informação Goiana do Rio de janeiro.

A escritora participou junto da amiga, Leodegária de Jesus, do Clube Literário Goiano e de um grupo de quatro jovens que dirigia o jornal literário chamado A Rosa em 1907. Em 1911, a autora casou-se com o advogado Cantídio Tolentino de Figueiredo Brêtas com quem teve seis filhos e se mudou para São Paulo. Permaneceu casado por 45 anos e, após a morte do marido, viveu parte no interior de São Paulo. Em 1956, voltou a Goiás, onde exerceu a profissão de doceira para sustentar a família, mas durante as horas vagas ocupava-se com seus versos.

O primeiro livro de Cora Coralina, Poemas dos Becos de Goiás e estórias mais, foi publicado em 1965 quando a autora já tinha 76 anos. Logo ficou conhecida pela sua forma moderna de fazer poesia em que misturava prosa com verso e transformava seus poemas numa narrativa única. Recebeu o título de Doutora Honoris Causa da Universidade Federal de Goiás. No ano de 1983, foi considerada a Intelectual do Ano do Troféu Juca Pato, além de receber a condecoração de Ordem do Mérito Cultural em 2006. É considerada uma escritora canônica e uma das maiores poetas do século XX. Faleceu no dia 10 de abril de 1985, em Goiânia, aos 95 anos.

Características da sua escrita

Embora não se encaixe em nenhum movimento literário, a autora possui em sua escrita traços do movimento modernista que vigorava na época de suas produções. Devido aos aspectos cotidianos, linguagem coloquial, regionalismo e desapego formal e valorização dos marginalizados, Cora Coralina configurou uma ruptura na literatura junto aos poetas modernistas.

Publicidade

  • Desapego formal: a autora ficou conhecida pelos seus versos e contos. Entretanto, os versos de seus poemas não possuíam o apego formal que tinham os poetas dos movimentos literários anteriores. Os versos de Cora Coralina são livres, sem rima e com métrica irregular. Alguns de seus poemas possuem caráter narrativo.
  • Temas simples e do cotidiano: os temas trabalhados pela escritora eram comuns e revelavam aspectos do cotidiano. A autora retomou também a própria infância para retratar em sua poética, além de questões universais como a identidade, o ensino escolar, a perspectiva da criança e as dificuldades da vida.
  • Regionalismo: é possível percebê-lo principalmente na obra Poemas dos Becos de Goiás e estórias mais que retrata diretamente as paisagens da cidade de Goiás, as paisagens rurais, as suas ruas, becos, casas e a população; retomando tanto a beleza quanto os aspectos sombrios da cidade.
  • Personagens marginalizados: uma das principais características da poética de Cora Coralina é o espaço dado a personagens marginalizados, sendo eles em sua grande maioria, as mulheres em geral, lavadeiras, mulheres da vida, as crianças abandonadas, os pobres e as pessoas simples.
  • Tradição oral: um traço marcante e único desenvolvido tanto nos contos quanto nos poemas é o caráter oral; por ser uma contadora de histórias, Cora Coralina reproduz no texto escrito aspectos orais, de caráter narrativo e linguagem coloquial.

Principais obras

As principais obras de Cora Coralina são:

  • Poemas dos Becos de Goiás e Estórias Mais (1965)
  • Vintém de cobre: meias confissões de Aninha (1983)
  • Estórias da Casa Velha da Ponte (1985)
  • Meu livro de cordel (1976)
  • O tesouro da casa velha (1989)

Agora que você conheceu as principais obras da autora, hora de ler alguns poemas. Vamos lá!

Poemas de Cora Coralina

Cora Coralina foi uma contadora de histórias. Além de contos e crônicas, a autora também ficou conhecida pelos seus poemas marcantes e belos.

Publicidade

Aninha e Suas Pedras
Não te deixes destruir…
Ajuntando novas pedras
e construindo novos poemas.
Recria tua vida, sempre, sempre.
Remove pedras e planta roseiras e faz doces. Recomeça.
Faz de tua vida mesquinha
um poema.
E viverás no coração dos jovens
e na memória das gerações que hão de vir.
Esta fonte é para uso de todos os sedentos.
Toma a tua parte.
Vem a estas páginas
e não entraves seu uso
aos que têm sede.

Melhores poemas

Saber Viver
Não sei…
se a vida é curta
ou longa demais para nós.
Mas sei que nada do que vivemos
tem sentido,
se não tocarmos o coração das pessoas.

Muitas vezes basta ser:
colo que acolhe,
braço que envolve,
palavra que conforta,
silêncio que respeita,
alegria que contagia,
lágrima que corre,
olhar que sacia,
amor que promove.

E isso não é coisa de outro mundo:
é o que dá sentido à vida.

É o que faz com que ela
não seja nem curta,
nem longa demais,
mas que seja intensa,
verdadeira e pura…
enquanto durar.

Becos de Goiás e estórias mais

Ofertas de Aninha (Aos moços)
Eu sou aquela mulher
a quem o tempo
muito ensinou.
Ensinou a amar a vida.
Não desistir da luta.
Recomeçar na derrota.
Renunciar a palavras e pensamentos negativos.
Acreditar nos valores humanos.
Ser otimista.
Creio numa força imanente
que vai ligando a família humana
numa corrente luminosa
de fraternidade universal.
Creio na solidariedade humana.
Creio na superação dos erros
e angústias do presente.
Acredito nos moços.
Exalto sua confiança,
generosidade e idealismo.
Creio nos milagres da ciência
e na descoberta de uma profilaxia
futura dos erros e violências
do presente.
Aprendi que mais vale lutar
do que recolher dinheiro fácil.
Antes acreditar do que duvidar.

Melhores poemas

Além dos poemas citados acima, muito conhecidos, um dos poemas mais difundidos da autora é Todas as vidas, título que também nomearia o primeiro filme sobre a sua história.

Todas as vidas
Vive dentro de mim
uma cabocla velha
de mau-olhado,
acocorada ao pé
do borralho,
olhando para o fogo.
Benze quebranto.
Bota feitiço…
Ogum. Orixá.
Macumba, terreiro.
Ogã, pai-de-santo…

Vive dentro de mim
a lavadeira
do Rio Vermelho.
Seu cheiro gostoso
d’água e sabão.
Rodilha de pano.
Trouxa de roupa,
pedra de anil.
Sua coroa verde
de São-caetano.

Vive dentro de mim
a mulher cozinheira.
Pimenta e cebola.
Quitute bem feito.
Panela de barro.
Taipa de lenha.
Cozinha antiga
toda pretinha.
Bem cacheada de picumã.
Pedra pontuda.
Cumbuco de coco.
Pisando alho-sal.

Vive dentro de mim
a mulher do povo.
Bem proletária.
Bem linguaruda,
desabusada,
sem preconceitos,
de casca-grossa,
de chinelinha,
e filharada.

Vive dentro de mim
a mulher roceira.
– Enxerto de terra,
Trabalhadeira.
Madrugadeira.
Analfabeta.
De pé no chão.
Bem parideira.
Bem criadeira.
Seus doze filhos,
Seus vinte netos.

Vive dentro de mim
a mulher da vida.
Minha irmãzinha…
tão desprezada,
tão murmurada…
Fingindo ser alegre
seu triste fado.

Todas as vidas
dentro de mim:
Na minha vida –
a vida mera
das obscuras!

Becos de Goiás e estórias mais

Frases de Cora Coralina

  1. “Versos… não. Poesia… não. Um modo diferente de contar velhas estórias.”
  2. “Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina.”
  3. “O que vale na vida não é o ponto de partida e sim a caminhada. Caminhando e semeando, no fim terás o que colher.”
  4. “Fiz a escalada da montanha da vida
    removendo pedras e plantando flores.”
  5. “Não morre aquele que deixou na terra a melodia de seu cântico na música de seus versos.”
  6. “Coração é terra onde ninguém vê.”
  7. “Poeta não é somente o que escreve.
    É aquele que sente a poesia, se extasia sensível ao achado de uma rima à autenticidade de um verso.”

Como você pode perceber, a escrita de Cora Coralina é apaixonante e chama a atenção pela mistura entre o poético e o prosaico.

Vamos conhecer mais sobre a escritora?

Você conheceu um pouco sobre a vida de Cora Coralina, conheceu as características literárias de sua obra e leu alguns de seus poemas mais famosos. Para sedimentar todo esse novo conhecimento, é hora de ver alguns vídeos

Curiosidades sobre Cora Coralina

Neste vídeo, você poderá conhecer mais sobre a autora com algumas curiosidades.

Cora Coralina por Cora Coralina

Quem melhor para falar de sua obra do que o próprio autor, certo? Aqui você pode conferir uma entrevista de Cora Coralina para o Programa Vox Populi.

Cora Coralina por Walderez de Barros

A atriz Walderez de Barros interpretou a poeta Cora Coralina no cinema, recentemente, no filme Todas as vidas. Conheça mais sobre o filme e o processo de preparação da atriz.

Portanto, Cora Coralina é um dos grandes nomes da literatura brasileira. Abordou temas do cotidiano, retomou as paisagens de um Goiás da sua infância e deu voz aos marginalizados.

Referências

Curso de literatura brasileira – Sergius Gonzaga;
História concisa da literatura brasileira – Alfredo Bosi;
Literatura – Fábio D’Ávila e Danton Pedro dos Santos.

Leonardo Ferrari
Por Leonardo Ferrari

Graduado em Letras pela Universidade Estadual de Maringá. É professor assistente em colégio de ensino médio. Nas horas livres, dedica-se à família, aos amigos, à sétima arte e à leitura.

Como referenciar este conteúdo

Ferrari, Leonardo. Cora Coralina. Todo Estudo. Disponível em: https://www.todoestudo.com.br/literatura/cora-coralina. Acesso em: 28 de March de 2024.

Exercícios resolvidos

1. [UEG]

ANINHA E SUAS PEDRAS
Não te deixes destruir…
Ajuntando novas pedras
e construindo novos poemas.
Recria tua vida, sempre, sempre.
Remove pedras e planta roseiras e faz doces. Recomeça.
Faz de tua vida mesquinha
um poema.
E viverás no coração dos jovens
e na memória das gerações que hão de vir.
Esta fonte é para uso de todos os sedentos.
Toma a tua parte.
Vem a estas páginas
e não entraves seu uso
aos que têm sede.

CORALINA, Cora. Aninha e suas Pedras. In: ______. Vintém de cobre: meias confissões de Aninha. 7 ed. São Paulo: Global, 2001. p. 148.

Depreende-se, da leitura do poema de Cora Coralina, que:

a) O trabalho doméstico é inferior à criação literária.
b) A criação literária é algo individualista e não pode se estender a outros.
c) A criação literária, nascida da simplicidade e de dificuldades, é uma forma de perpetuação.
d) A criação literária é causa necessária da perpetuação da simplicidade e de dificuldades.

Resposta: C.

Justificativa: Um dos principais temas trabalhados por Cora Coralina é a simplicidade da vida e os seus desafios, o poema em questão trata sobre a transformação das dificuldades da vida em arte e poema, para que assim sejam eternas por meio de cada nova leitura.

2. [UEG]

ANINHA E SUAS PEDRAS
Não te deixes destruir…
Ajuntando novas pedras
e construindo novos poemas.
Recria tua vida, sempre, sempre.
Remove pedras e planta roseiras e faz doces. Recomeça.
Faz de tua vida mesquinha
um poema.
E viverás no coração dos jovens
e na memória das gerações que hão de vir.
Esta fonte é para uso de todos os sedentos.
Toma a tua parte.
Vem a estas páginas
e não entraves seu uso
aos que têm sede.

CORALINA, Cora. Aninha e suas Pedras. In: ______. Vintém de cobre: meias confissões de Aninha. 7 ed. São Paulo: Global, 2001. p. 148.

O título do poema, somado a informações biográficas da autora, mostra que o eu-lírico
a) sente-se melancólico diante das dificuldades descritas.
b) revela sua própria experiência e a estende aos outros.
c) demonstra decepção ao perceber sua vida mesquinha.
d) observa a vida ao seu redor de modo indiferente.

Resposta: B.

Justificativa: A obra de Cora Coralina carrega inúmeros aspectos biográficos, como o próprio nome da autora, fatos de sua vida e paisagens de onde morou. No caso do poema citado, ao retomar informações sobre a vida autora, há o objetivo de fazer com que o leitor viva experiências da vida dela.

3. [UFT]

Cantoria
Meti o peito em Goiás
e canto como ninguém.
Canto as pedras,
canto as águas,
as lavadeiras, também.

Cantei um velho quintal
com murada de pedra.
Cantei um portão alto
com escada caída.

Cantei a casinha velha
de velha pobrezinha.
Cantei colcha furada
estendida no lajedo;
muito sentida,
pedi remendos pra ela. (…)

Fonte: CORALINA, Cora. Meu livro de Cordel. São Paulo: Global, 2013, p. 9.

A partir da leitura do excerto de Cantoria, é INCORRETO afirmar que

a) o título do poema faz alusão ao universo ágrafo dos menestréis nordestinos que cantam repentes e narram estórias orais.
b) o poema Cantoria apresenta uma relação intrínseca entre ser e ter e revela a dualidade entre campo e cidade.
c) o poema Cantoria apresenta recursos estilísticos como rima, ritmo e repetição.
d) a poeta goiana parte de temas extraídos do cotidiano para criar sua poesia.

Resposta: B.

Justificativa: O poema em questão retrata as paisagens do Goiás e não faz diferenciação entre o campo e a cidade ou sobre ser e ter, possui apenas o intuito de enaltecer a cidade de seu nascimento.

Compartilhe

TOPO