Ceticismo

O ceticismo é uma doutrina originada na Grécia Antiga e teria sido fundado por Pirro de Élida. É conhecido por pregar a total suspensão dos juízos para que se alcance uma vida serena.

Na linguagem corrente, chamamos de cético aquele que duvida de tudo. No entanto, enquanto doutrina filosófica, o ceticismo possui características que fundamentam a dúvida, este é o caso dos ceticismos filosófico e científico. Estes utilizam o ceticismo como premissa para não acolher informações como verdadeiras do modo elas nos são apresentadas, exigindo uma postura crítica e de discernimento.

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O que é ceticismo

O termo ceticismo deriva da palavra grega skepsis, que significa investigação. Portanto, os que se identificam como céticos consideram-se investigadores. A respeito de sua origem, enquanto movimento filosófico, teve início no período helenista por volta do século III a.C., tendo como principais precursores Pirro de Élida (c. 360-270 a.C.) e, de certo modo, os sofistas. Algumas vertentes também consideram a dialética platônica, como a representação socrática em sua obra, uma forma de ceticismo; isto é, o “só sei que nada sei” de Sócrates, mais do que um artifício retórico, retrataria a inexistência de verdades absolutas.

Principais características

O ceticismo é uma doutrina filosófica que se mistura ao estilo de vida de seus adeptos, de modo que o conceito persiste até hoje para denominar aquele que tudo questiona. Todavia, há algumas características que distinguem o cético de um mero questionador, as quais listamos abaixo:

  • Acatalepsia: é a atitude de negação da possibilidade de se alcançar a verdade, isto é, entende-se que não é possível compreender e apreender os objetos como de fato são. Sendo assim, a consequência deve ser a suspensão total do juízo das coisas.
  • Suspensão do juízo: do grego, epoché, consiste em não emitir juízo de valor acerca de conhecimento algum, ou seja, não declarar a veracidade ou falsidade das coisas, bem como se são boas ou más, feias ou belas. A despreocupação em julgar as coisas leva à imperturbabilidade da alma (do grego, ataraxia), pois se deixa de perseguir as verdades inalcançáveis com desejo vão.
  • Indagação e investigação: como já mencionado, o cético é um investigador na própria etimologia da palavra. Deste modo, quem adere a esta doutrina se encontra em constante estado de investigação e indagação. Todavia, isso não significa que de alguma maneira o cético poderá alcançar uma verdade. Ele sabe que não. Portanto, sua busca pelo conhecimento é desinteressado e interminável.
  • Essas três características são a base do ceticismo Antigo que teve reformulações ao longo da história da filosofia. A seguir, veremos como o conceito se adapta às esferas filosófica e científica.

    Ceticismo filosófico

    O ceticismo filosófico não consiste em uma dúvida pura e simples, mas em duvidar do conhecimento das coisas que achamos plausíveis conhecer. Ou seja, não se trata de duvidar de algo sobre a qual certamente não nos seria possível conhecer a verdade – como quantas estrelas há no céu -, mas duvidar do conhecimento aceito como verdadeiro, como se o sol aparecerá ao amanhecer. A isso, Russell (2015) denomina “dúvida dogmática” e explica que enquanto o cientista crê conhecer algo, mas não estar certo sobre o assunto, o curioso afirma não saber de algo, mas querer descobrir; por sua vez, o cético filosófico diz que “ninguém sabe e jamais saberá”.

    Ceticismo científico

    O ceticismo científico busca combater as pseudociências, isto é, alegações que dizem basear-se em experimentos científicos. Por isso, acabam ganhando a credibilidade de algumas pessoas. Essas pseudociências podem utilizar linguagem complexa e artimanhas que imitam pesquisas científicas, auto afirmando serem “cientificamente comprovadas” para ludibriar, principalmente, quem não dispõe de conhecimento técnico. Nesse sentido, o ceticismo científico não consiste em duvidar da ciência, mas em fazer uso do pensamento crítico para reconhecer quando determinados argumentos podem ser considerados equívocos ou até mesmo fraudulentos.

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    Ceticismo e dogmatismo

    Dogmatismo é um termo utilizado desde a Antiguidade para demarcar uma oposição ao ceticismo, ou seja, eram dogmáticos os que não eram céticos. Um dos primeiros filósofos a utilizar o termo deste modo foi o Sexto Empírico, um cético da Escola Pirrônica que teria vivido entre os séculos II e III. Nesse sentido, enquanto o cético questiona a existência de verdades absolutas que possam ser acessadas pelos seres humanos, os dogmáticos, pelo contrário, creem na existência de verdades absolutas acessíveis. Na modernidade, Immanuel Kant (1724-1804), com a influência de David Hume (1711-1776), chama de dogmáticos aqueles que aventuram a razão fora de sua esfera, isto é, que raciocinam “levianamente” sobre as coisas das quais nada se pode afirmar, como os objetos metafísicos que estão além da esfera da experiência possível.

    Crítica ao ceticismo

    As críticas mais comuns ao ceticismo advém dos que creem na possibilidade do conhecimento de verdades absolutas, seja pela racionalidade ou pela fé. Há ainda os críticos que compreendem o ceticismo como uma doutrina da dúvida radical e que, por isso, se recusaria à investigação e ao diálogo, crítica essa direcionada também aos dogmáticos pelos próprios céticos.

    Além disso, na prática do cotidiano, é alvo de críticas aquele que suspende seu juízo e evita posicionar-se a respeito de assuntos polêmicos em voga. Essa prática é comum quanto a temas polarizados como a política, assim, quando a pessoa não se identifica com nenhuma vertente, opta por manter-se neutro. Por outro lado, há os que duvidam radicalmente sobre a possibilidade de quaisquer mudanças na conjuntura e, por isso, desinteressam-se pelo olhar crítico e pelo conhecimento. Cabe ressaltar que essa compreensão de senso comum do ceticismo foge dos critérios estabelecidos e ensinados por Pirro.

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    Vídeos sobre o ceticismo

    Após apresentarmos os princípios céticos, selecionamos alguns vídeos sobre o ceticismo para aprofundar ainda mais seus conhecimentos.

    A origem do ceticismo filosófico

    A professora Carlinha Bassan explica o ceticismo a partir de suas origens helenistas.

    Além da mera dúvida

    Neste vídeo, o professor Júlio Cesar explora o conceito de ceticismo e vai além da ideia de que ser cético é duvidar de tudo.

    A trilha do conhecimento

    Com poesia misturada a conceitos filosóficos, Victor Naine explica a postura cética em relação ao conhecimento.

    A relação com a verdade

    Aqui, o professor Mateus Salvadori apresenta três modos com os quais podemos nos relacionar com a verdade: ceticismo, dogmatismo e falibilidade.

    Ceticismo e a Matrix

    O que a doutrina pirrônica tem a ver com a Matrix? Kherian Gracher, do canal SciFilo, explica e ilustra o ceticismo referenciando o já clássico argumento da Matrix.

    Como visto até aqui, o ceticismo, como doutrina, originou-se por volta do século III na Grécia Antiga, tendo como um de seus fundadores Pirro de Élida. Ademais, o ceticismo perdura para além desta corrente, sendo também um instrumento para o conhecimento crítico, como no caso do ceticismo científico. Por fim, para conhecer outras doutrinas do período helenista, acesse também nosso conteúdo sobre Estoicismo e Epicurismo.

    Referências

    ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. – 5ª ed. – São Paulo: Martins Fontes, 2007.

    COMESAÑA, Juan; KLEIN, Peter. Skepticism. The Stanford Encyclopedia of Philosophy (Winter 2019 Edition), Edward N. Zalta (ed.). Disponível em: https://plato.stanford.edu/archives/win2019/entries/skepticism/ Acesso em: 7 de julho de 2020.

    KNOBEL, Marcelo. Ciência e Ceticismo. Jornal da Unicamp – Universidade Estadual de Campinas. Edição de 14 a 20 de julho de 2003.

    RUSSELL, Bertrand. História da Filosofia Ocidental. 1 vol. – Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2015.

Thaís Bravin Carmello
Por Thaís Bravin Carmello

Licenciada e mestra em Filosofia pela Universidade Estadual de Maringá.

Como referenciar este conteúdo

Carmello, Thaís Bravin. Ceticismo. Todo Estudo. Disponível em: https://www.todoestudo.com.br/filosofia/ceticismo. Acesso em: 19 de April de 2024.

Exercícios resolvidos

1. [ENEM]

Pirro afirmava que nada é nobre nem vergonhoso, justo ou injusto; e que, da mesma maneira, nada existe do ponto de vista da verdade; que os homens agem apenas segundo a lei e o costume, nada sendo mais isto do que aquilo. Ele levou uma vida de acordo com esta doutrina, nada procurando evitar e não se desviando do que quer que fosse, suportando tudo, carroças, por exemplo, precipícios, cães, nada deixando ao arbítrio dos sentidos.
LAÉRCIO, D. Vidas e sentenças dos filósofos ilustres. Brasília: Editora UnB, 1988.
O ceticismo, conforme sugerido no texto, caracteriza-se por:
a) Desprezar quaisquer convenções e obrigações da sociedade.
b) Atingir o verdadeiro prazer como o princípio e o fim da vida feliz.
c) Defender a indiferença e a impossibilidade de obter alguma certeza.
d) Aceitar o determinismo e ocupar-se com a esperança transcendente.
e) Agir de forma virtuosa e sábia a fim de enaltecer o homem bom e belo.

Resposta: C
Justificativa: Pirro, um dos precursores do ceticismo, defendia a negação da possibilidade de apreender verdades e a suspensão do juízo para que se alcance uma vida feliz, sem perturbações da alma.

2. [UEG]

Em meados do século IV a.C., Alexandre Magno assumiu o trono da Macedônia e iniciou uma série de conquistas e, a partir daí, construiu um vasto império que incluía, entre outros territórios, a Grécia. Essa dominação só teve fim com o desenvolvimento de outro império, o romano. Esse período ficou conhecido como helenístico e representou uma transformação radical na cultura grega. Nessa época, um pensador nascido em Élis, chamado Pirro, defendia os fundamentos do ceticismo. Ele fundou uma escola filosófica que pregava a ideia de que:
a) seria impossível conhecer a verdade.
b) seria inadmissível permanecer na mera opinião.
c) os princípios morais devem ser inferidos da natureza.
d) os princípios morais devem basear-se na busca pelo prazer.

Resposta: A
Justificativa: A premissa do ceticismo é que não se consegue conhecer verdades, pois, segundo Pirro, tudo o que nos é apreensível são aparências, as quais são mutáveis.

3. [UFSJ]

Sobre o ceticismo, é CORRETO afirmar que
a) os céticos buscaram uma mediação entre “o ser” e o “poder-ser”.
b) o ceticismo relativo tem no subjetivismo e no relativismo doutrinas manifestamente apoiadas em seu princípio maior: toda interatividade possível.
c) Protágoras (séc. V a.C.), relativista, afirmou que “o Homem só entende a natureza porque o conhecimento emana dela e nela se instala”.
d) Górgias (485-380 a.C.) e Pirro (365-275 a.C.) são apontados como possíveis fundadores do ceticismo.

Resposta: D
Justificativa: A alternativa correta é, evidentemente, a que aponta Pirro como um dos fundadores do ceticismo. As outras alternativas podem ser desconsideradas, pois, os aspectos a que se referem não pertencem ao conceito de ceticismo.

4. [UDESC]

Segundo a tradição filosófica, comente a atitude que caracteriza alguém como um cético.

Resolução: Para responder a esta questão discursiva corretamente é importante que o candidato discorra sobre as principais características da doutrina cética, sendo elas: a atitude de negar a possibilidade de alcançar a verdade (acatalepsia); a suspensão do juízo (epoché); e a atitude de constante investigação e indagação desinteressada de alcançar verdades absolutas.

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