Anacronismo

O anacronismo é visto como um ato inadequado ou um erro, principalmente em estudos históricos. Ele ocorre geralmente quando se projeta o presente em um tempo passado.

Quando discutimos ou estudamos determinado assunto, é comum realizarmos comparações e conexões. Essas relações muitas vezes são feitas entre coisas que vêm de situações, contextos e momentos históricos diferentes. Consequentemente, é sempre válido questionar se tais relações são válidas ou até que ponto são verdadeiras: esse é o problema do anacronismo.

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Geralmente, o anacronismo é considerado um erro porque parece impedir a compreensão clara e direta de um momento histórico. Entenda mais a seguir o que é o anacronismo e por quais razões ele é inadequado.

O que é anacronismo

O anacronismo é uma inadequação cronológica; ou seja, é o ato de atribuir ideias de uma época a uma outra, de momentos históricos diferentes. Ele vem do grego e significa “contra o tempo”, ou “fora do tempo”. Por isso, é geralmente considerado um erro ou mesmo um “pecado mortal” para historiadores. Entretanto, o anacronismo é ainda um tema de debate em diversas disciplinas.

Anacronismo histórico

O anacronismo pode ocorrer quando um historiador utiliza ideias do seu presente para estudar o passado. Consequentemente, o passado é interpretado a partir de um pensamento que corresponde ao atual, mas não aquele próprio do tempo estudado.

É comum que o anacronismo ocorra também ao estudar ou debater palavras iguais. Por exemplo, o conceito de “direita” e “esquerda” utilizados durante a Guerra Fria não podem ser completamente transportados para compreender a “direita” e a “esquerda” atualmente.

O anacronismo é um erro?

Quando há uma tentativa de estudar o passado histórico de maneira neutra e imparcial, o anacronismo certamente é um grande inimigo. Isso porque o anacronismo mostraria um viés do historiador, que estaria usando as ideias de seu próprio tempo para entender o passado e não “enxergando” a história de maneira objetiva e direta.

Entretanto, é impossível estudar o passado de forma direta, pois não há como acessar mais essa história. Portanto, o anacronismo pode sempre existir em algum nível: o que faz diferença é o quão anacrônica é a interpretação desse passado.

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Além disso, a própria ideia de “anacronismo” tem sua história. Nem todos os povos, em todos os momentos históricos, pensaram que o anacronismo seria um erro. Assim, considerar o anacronismo um erro absoluto pode não ser a melhor forma de encarar o problema.

Por fim, é necessário atentar às consequências do anacronismo feito. Alguns anacronismos provocam julgamentos e preconceitos com o passado, tornando uma compreensão da história difícil de ser realizada.

Anacronismo religioso

As mais diversas religiões que existem no mundo possuem suas histórias e trajetórias. Todavia, é possível ser anacrônico quando se utiliza esse passado da religião para justificar algo no presente, ou o contrário. Exemplos mais comuns desse tipo de anacronismo se encontram tipicamente no cristianismo.

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Por exemplo, há discussões dentro de religiões cristãs se o uso de vestes e de alguns costumes são adequados hoje conforme a Bíblia. Nesses casos, projeta-se um problema do presente no passado, que tinha seus próprios contextos históricos e culturais, e não possuía tal problema. Assim, pode-se incorrer em um anacronismo bíblico.

Diacronismo e sincronismo

Apesar de o anacronismo ser um ato geralmente inadequado em um estudo, existem outros modos de estudar a história humana: a forma diacrônica ou sincrônica. Entenda abaixo a diferença entre esses olhares para o passado de um grupo.

  • Diacronismo: estuda a evolução, a transformação e a progressão de um fenômeno ao longo do tempo. Desse modo, o próprio fenômeno muda historicamente em uma análise diacrônica.
  • Sincronismo: estuda o fenômeno dentro de um momento histórico em particular, com os elementos de seu próprio contexto para explica-lo. Assim, a maneira como o fenômeno estudado muda com o tempo não é interesse de uma análise sincrônica.

Em suma, existem diversos modos de analisar e estudar um material histórico. Além do sincronismo e do diacronismo, há outros métodos disponíveis que, inclusive, podem incorrer menos em um anacronismo.

Exemplos de anacronismo

Para entender mais sobre como o anacronismo ocorre, confira abaixo uma lista de exemplos de frases ou afirmações que são anacrônicas. Eles podem te ajudar a aplicar a ideia de anacronismo em outros casos concretos.

  • “Como antigamente as pessoas se comunicavam sem telefone?”: nessa pergunta há uma projeção de uma necessidade do presente no passado. Assim, o passado é visto como um atraso ou uma época em que faltavam elementos que hoje pensamos como essenciais.
  • “Quem era o presidente na Roma antiga?”: o sistema político que tem um presidente da República é recente e é o que se conhece atualmente em geral. Pensar que outras épocas e outras sociedades possuíam o mesmo sistema é uma questão que parte de um anacronismo.
  • “Os indígenas antes da colonização não tinham civilização”: de fato, os povos que iniciaram o projeto civilizatório foram europeus. Todavia, é anacrônico cobrar que sociedades indígenas antes dessa intrusão fossem parecidas com a Europa ou considerar que elas deveriam ser civilizadas. A “civilização” era um problema e um interesse de europeus, e não de outros povos, que viviam em um contexto diverso e tinham necessidades diferentes.
  • “O nazismo era de esquerda”: o que se entende por “direita” e “esquerda” pode ser bastante diferente ao longo do tempo e do contexto social. Utilizar ideias arbitrárias e atuais sobre esses conceitos e aplicar em no momento histórico que ocorreu o nazismo é um ato anacrônico.

Nesses sentidos retratados nos exemplos, o anacronismo é uma atitude que faz o indivíduo partir de seus próprios pressupostos e aplicá-los e outros tempos históricos. Esse ato pode estar relacionado também com o etnocentrismo.

Entenda mais sobre anacronismo

O anacronismo é um termo bastante difundido e pode ser utilizado por estudiosos de diversas áreas. Entretanto, essa palavra abarca uma variedade de assuntos além daqueles acadêmicos. Para ver mais sobre como diferentes pessoas pensam o tema, confira a lista abaixo.

Revisando o significado do termo

Revise em um minuto o significado dessa palavra. Neste vídeo, o anacronismo é considerado um erro histórico porque cada momento é considerado específico e próprio, não podendo ser utilizado para compreender outros contextos.

Por que o anacronismo é um problema?

Nesse vídeo, o prof. Robert Darnton explica mais sobre o anacronismo e suas possíveis consequências. Essa explicação rápida ajuda a entender melhor sobre o que é ser anacrônico e compreender que existem talvez níveis de anacronismo diferentes.

Relações entre anacronismo, diacronismo e sincronismo

Entenda com mais exemplos as relações entre os conceitos de anacronismo, diacronismo e sincronismo. Essa explicação é feita no vídeo a partir da visão de um historiador, mas é bastante útil para pensar esses termos em outras disciplinas.

Pensando mais sobre anacronismo

Se você quer pensar mais sobre o anacronismo em outros contextos e sentidos, assista a esse vídeo de outro professor explicando o tema.

Por fim, é bastante importante estar atento aos anacronismos para não incorrer em alguns erros. Consequentemente, compreender uma época ou uma sociedade em suas particularidades torna-se mais importante para estudar o assunto.

Referências

Edgar Cabral Viegas Borges da Cruz – Anacronismo: agente facilitador ou obstáculo à prática docente?;

André Fabiano Voigt – Qual a importância de uma época? Anacronismo e história;

José Eustáquio Ribeiro – Da sincronia à diacronia: os “três tempos” da “história total” de Braudel a partir de um diálogo com Levi-Strauss.

Mateus Oka
Por Mateus Oka

Mestre em Antropologia Social pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Cientista social pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). Realiza pesquisas na área da antropologia da ciência.

Como referenciar este conteúdo

Oka, Mateus. Anacronismo. Todo Estudo. Disponível em: https://www.todoestudo.com.br/sociologia/anacronismo. Acesso em: 29 de March de 2024.

Exercícios resolvidos

1. [ETAPA-SP]

O historiador Caio Prado Júnior ao realizar um balanço dos três séculos de colonização portuguesa no Brasil assinala: “… trata-se de uma situação que ainda não existe, que não tem conteúdo próprio, mas é apenas um estado latente que se revela por alguns fatos precursores, sintomáticos, mas isolados. Tais fatos vêm de longe, desde o início da colonização, se quiserem. E em rigor, poderíamos apanhá-los em qualquer altura de nossa evolução histórica.
(…) O historiador, ao ocupar-se dela, enfrenta o risco de tratar o assunto anacronicamente, isto é, conhecedor que é da fase posterior, em que ocorre seu desenlace, em que ela se define, projetar esta fase no passado.” Caio Prado Júnior. – Formação do Brasil contemporâneo. São Paulo: Editora Brasiliense, 1963. pp. 357-358. *anacronismo = consiste em usar termos e conceitos de um período histórico em um outro período que não corresponde ao analisado.

Segundo o texto:
A) anacronismo consiste em projetar o presente no passado.
B) todos os historiadores praticam o anacronismo.
C) o anacronismo é um método de investigação.
D) os estados latentes geralmente são anacrônicos.
E) a colonização é uma manifestação de anacronismo.

Resposta: A

Justificativa: o ato de projetar os conceitos, costumes e ideias do presente para um tempo passado é a característica do anacronismo, que deve ser evitado por estudiosos.

2. [FBUNI (adaptada)]

“Atribuir a fundação do Ceará/Fortaleza a Martim Soares Moreno/Matias Beck é incorrer num anacronismo, ou seja, é um erro em cronologia, expresso na falta de alinhamento temporal. (…) Dizer que Moreno ou Beck são os fundadores destas terras é algo totalmente artificial, simplesmente porque, no século XVI, lusitanos e holandeses não estiveram aqui para fundar cidades, mas com a intenção clara de explorar a terra.”

Por esse fragmento, podemos deduzir corretamente que:
A) as tentativas de conquista foram em vão, uma vez que não se sabe quem, realmente, fundou
Fortaleza.
B) o conceito de fundação de uma cidade deve ser preciso, porque não pode haver muitas
interpretações da História.
C) pelas datas, quem fundou Fortaleza foi Pero Coelho, porque ergueu o forte São Tiago, às margens do rio Ceará (atual Barra do Ceará).
D) Fortaleza surgiu espontaneamente, aos poucos, não sendo fruto da ação intencional de uma única pessoa em determinada data.
E) a data oficial da fundação é 1654, porque o forte Schoonenborch foi renomeado “Fortaleza de
Nossa Senhora da Assunção”, nome oficial de Fortaleza.

Resposta: A

Justificativa: o enunciado aponta que há um erro anacrônico, ou seja, cronológico ao apontar que tais indivíduos são fundadores dessas terras. Não se sabe quem realmente teria fundado tais terras.

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