Rubem Fonseca

Rubem Fonseca foi um importante escritor brasileiro que escreveu obras literárias permeadas por questões históricas, estilo policial, violência e mistério.

José Rubem Fonseca (1925-2020) é um dos principais escritores brasileiros. É conhecido pelo fato de unir fatos históricos ao estilo policial. Entre outros fatores, isso foi possível devido à experiência de trabalho durante anos em delegacias. Há certa dificuldade em situá-lo em um período literário, visto que sua primeira obra, Os Prisioneiros, foi publicada em 1963 e a última, Carne Crua, em 2018.

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Biografia

O autor Rubem Fonseca. Zeca Fonseca/Divulgação. Fonte: Veja.

Rubem Fonseca nasceu em Juiz de Fora (MG) em 1925. É conhecido por ter uma narrativa que mistura fatos históricos e ficcionais em um estilo investigativo e policial. Além disso, seus textos são permeados por violência e questões políticas polêmicas. Um exemplo é seu romance Agosto (1990), no qual o autor traz à tona hipóteses e situações que culminaram no suicídio de Getúlio Vargas em agosto de 1954.

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Formado em Direito, trabalhou como comissário no 16° Distrito Policial em São Cristovão, no Rio de Janeiro. Sendo assim, essa trajetória serviu de inspiração para criar seu universo literário. Além dessa figuração no mundo policial, as narrativas de Fonseca não poupam a linguagem informal, marcada, sobretudo, por palavrões.

Sua estreia na literatura se deu com o livro de contos Os prisioneiros (1963). Ao longo de sua vida publicou mais de dez livros, entre romances, contos e crônicas. Todavia, tornou-se mais conhecido com a publicação de Feliz Ano Novo (1975), livro de contos que teve a primeira edição censurada durante o regime militar por ferir a moral e os bons costumes.

Rubem Fonseca faleceu em 15 de abril de 2020 devido a um infarto. Antes de partir, entretanto, deixou uma vasta obra. Recebeu grandes prêmios literários, tais como: Jabuti, Camões e Machado de Assis. Também teve livros adaptados para o cinema e TV.

Cobrador: In God We Trust (2006), fime baseado na obra homônima e dirigido por Paul Leduc. Fonte: IMDB.

Contexto histórico

Há uma certa complexidade em situar Rubem Fonseca em um período literário específico e contexto histórico fixo, uma vez que ele teve seu primeiro livro publicado nos anos 60, mas seguiu produzindo literatura ao longos dos anos. Sua última publicação oficial foi Carne Crua, em 2018, época ainda inclassificável dentro dos estudos literários.

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Sendo assim, pode-se dizer que Fonseca apontou no mundo da literatura na chamada Geração de 45, da 3ª fase modernista, que alguns teóricos dizem ir até os anos 60, enquanto outros defendem que se estende até os anos 80. Salienta-se que se trata da fase menos conturbada do Modernismo porque o país já está em fase de redemocratização do país. Afinal, havia terminado o Estado Novo (1937-1945), implementado pela ditadura de Getúlio Vargas. Mundialmente, o ano de 45 marca o fim da Segunda Guerra Mundial e do sistema totalitário do Nazismo, contudo há o início da Guerra Fria, entre EUA e União Soviética, bem como a Corrida Armamentista.

Vale ressaltar, por fim, que o autor também produziu obras literárias também no período chamado de Pós-Modernista, correspondente ao que foi publicado após o período classificado como Modernismo. No entanto, há estudiosos que denominam as publicações recentes como Literatura Contemporânea. Não há um consenso a respeito dessas nomenclaturas, visto que se trata de um período recente no qual ainda nos encontramos.

Principais obras

A seguir, conheça algumas das obras que Rubem Fonseca publicou ao longo de sua extensa carreira como escritor.

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Feliz ano novo (1975)

Trata-se de uma coletânea de contos, a qual tem como elemento principal a violência. Possui uma linguagem direta e precisa, uma marca de Rubem Fonseca em suas obras. Há, também, crítica social no que diz respeito à constituição da sociedade brasileira, seus hábitos e costumes. Não foi à toa que a obra foi proibida em todo território nacional à época.

O cobrador (1979)

Um dos mais famosos livros de Rubem Fonseca, O Cobrador apresenta um mundo de figuras extravagantes e, ao mesmo tempo, admiráveis, sendo impossível sentir-se indiferente às mazelas que imperam no país. Os contos mostram um Brasil onde o controle é feito por meio da violência, muitas vezes, fazendo uso de uma ferramenta que todos conhecemos: a linguagem.

Mandrake, a Bíblia e a Bengala (2005)

Nesta obra de cunho policial, há um clima de tensão e subversão. O advogado criminalista Mandrake procura o namorado desaparecido de uma bibliófila. Nesse percurso, acaba fazendo uma incursão em um mundo de colecionadores de livros raros e descobre que uma Bíblia impressa por Gutenberg havia sido roubada dos cofres da Biblioteca Nacional. Por fim, mortes e suspeitos figuram nessa obra trazendo ainda mais mistérios a serem desvendados.

Outras obras do autor:

  • Os prisioneiros (19630);
  • Lúcia McCartney (1969);
  • Caso Morel (1973);
  • Bufo & Spallanzani (1986);
  • Vastas Emoções e Pensamentos Imperfeitos (1988);
  • Agosto (1990);
  • Carne Crua (2018).

Conforme visto, Rubem Fonseca teve uma longa trajetória como escritor, sendo um grandes nomes da literatura nacional. Procure conhecê-lo melhor!

5 Frases de Rubem Fonseca

A seguir, veremos algumas frases retiradas de obras de Fonseca, portanto, tratam-se de falas de seus personagens. O autor nunca deu muitas entrevistas, preferindo a reclusão.

  1. “Beijei-a na boca. Aos poucos ela foi entreabrindo os lábios, mantendo os olhos fechados. Eu não fecho os olhos nunca. Gosto de deixar todos os meus sentidos funcionando. Por esse motivo, não ingiro estupefacientes quando me encontro com uma mulher: os prazeres governados pela lucidez são mais aguçados, a euforia insensibiliza” (trecho de Diário de um fescenino).
  2. “Morel sentado na capa. Deita lentamente, com os braços cruzados sobre os olhos. Vilela pega um livro, sobre a mesa. Visão e invenção.
    “Adianta escrever, se ninguém vai ler?”
    “Adianta, sempre.”
    “Passo as noites sonhando com a minha carreira literária”, a ironia na voz é forçada” (trecho de O Caso Morel).
  3. “Agora diga, falando sério, você não pensou nada mesmo, quando eu te passei o bilhete? Não. Mas se você quer, eu penso agora, eu disse. Pensa, Ângela disse. Existem duas hipóteses. A primeira é que você me viu no carro e se interessou pelo meu perfil. Você é uma mulher agressiva, impulsiva e decidiu me conhecer. Uma coisa instintiva. Apanhou um pedaço de papel arrancado de um caderno e escreveu rapidamente o nome e o telefone. Aliás, quase não deu para eu decifrar o nome que você escreveu. E a segunda hipótese? Que você é uma puta e sai com uma bolsa cheia de pedaços de papel escritos com o seu nome e o telefone. Cada vez que você encontra um sujeito num carro grande, com cara de rico e idiota, você dá o número para ele. Para cada vinte papelinhos distribuídos, uns dez telefonam para você. E qual a hipótese que você escolhe?, Ângela disse. A segunda. Que você é uma puta, eu disse” (trecho do conto “Passeio Noturno”).
  4. “Quando satisfaço meu ódio sou possuído por uma sensação de vitória, de euforia que me dá vontade de dançar — dou pequenos uivos, grunhidos, sons inarticulados, mais próximos da música do que da poesia, e meus pés deslizam pelo chão, meu corpo se move num ritmo feito de gingas e saltos, como um selvagem, ou um macaco” (trecho do conto “O cobrador”).
  5. “Enquanto isso, aumentavam as manifestações de protesto contra o presidente da República. As assembleias Legislativas de quase todos os estados do Brasil exigiam a renúncia de Vargas. O Instituto de Advogados do Brasil aprovou uma moção, com quarenta e três votos a favor e seis contra, afirmado considerar o país acéfalo e pedindo às Forças Armadas que retirassem Vargas do Palácio do Catete e garantissem a posse de Café Filho, vice-presidente eleito, para que a legalidade fosse restaurada” (trecho de Agosto).

Agora que você conheceu um pouco melhor a trajetória e obra de Rubem Fonseca, aprofunde seus conhecimentos no item seguinte.

Rubem Fonseca: cinco características de sua escrita

Para fixar o que vimos até aqui, elencamos algumas videoaulas que permitirão perceber as multifacetas deste autor contemporâneo, suas influências e características. Lembre-se que todo trabalho de descrição do estilo de qualquer escritor ganha vida quando, de fato, lemos sua obra. Imprescindível adentrar o universo literário!

Rubem Fonseca: cinco características de sua escrita

Saiba um pouco mais sobre as características da escrita do autor.

Vida e obra de Rubem Fonseca

Saiba mais sobre a vida e obra de um dos mais famosos escritores brasileiros.

O cobrador, de Rubem Fonseca

Entenda a obra O cobrador, de Rubem Fonseca.

O que é literatura contemporânea?

Não sabe o que é literatura contemporânea? Entenda seus principais aspectos neste vídeo.

Diante dessa breve exposição sobre Rubem Fonseca e sua vasta obra, esperamos ter ajudado a aprender mais acerca da Literatura Contemporânea a partir de um dos principais escritores expoentes deste período. Complemente seus estudos lendo sobre o Modernismo no Brasil, escola que lançou bases para o que conhecemos atualmente como produção literária.

Referências

BOSI, Alfredo. História Concisa da Literatura Brasileira. São Paulo: Cultrix, 2006.
ABAURRE, Maria Luiza M.; PONTARA, Marcela. Literatura Brasileira: tempos, leitores e leituras. São Paulo: Moderna, 2005.

Estela Santos
Por Estela Santos

Doutoranda em Letras - Estudos Literários (UEM), professora, redatora e mediadora do #LeiaMulheres - Maringá.

Como referenciar este conteúdo

Santos, Estela Pereira dos. Rubem Fonseca. Todo Estudo. Disponível em: https://www.todoestudo.com.br/literatura/rubem-fonseca. Acesso em: 28 de March de 2024.

Exercícios resolvidos

1.

1. Assinale a alternativa que preenche corretamente as lacunas do texto abaixo, na ordem em que aparecem.

Rubem Fonseca é considerado por alguns críticos como um escritor _______, por focalizar, em diferentes textos, a _______ dos centros urbanos, nas ações dos ________, tal como acontece no conto __________.

a) intimista – solidão – miseráveis – “Passeio Noturno”.
b) realista – corrupção – ambientalistas – “Intestino Grosso”.
c) brutalista – violência – delinquentes – “Feliz Ano Novo”.
d) pornográfico – corrupção – policiais – “Corações Solitários”.
e) controvertido – violência – policiais – “Intestino Grosso”.

Resposta: C. Rubem Fonseca é um escritor brasileiro considerado BRUTALISTA em função de apresentar em seus textos uma realidade repleta de VIOLÊNCIA, apresentando personagens considerados DELINQUENTES socialmente, como é possível observar em “FELIZ ANO NOVO”.

2. [FACERES Medicina (2014)]

Passeio Noturno

“Cheguei em casa carregando a pasta cheia de papéis, relatórios, estudos, pesquisas, propostas, contratos. Minha mulher, jogando paciência na cama, um copo de uísque na mesa de cabeceira, disse, sem tirar os olhos das cartas, você está com um ar cansado. Os sons da casa: minha filha no quarto dela treinando impostação de voz, a música quadrifônica do quarto do meu filho. Você não vai largar essa mala?, perguntou minha mulher, tira essa roupa, bebe um uisquinho, você precisa aprender a relaxar.
Fui para a biblioteca, o lugar da casa onde gostava de ficar isolado e como sempre não fiz nada. Abri o volume de pesquisas sobre a mesa, não via as letras e números, eu esperava apenas. Você não para de trabalhar, aposto que os teus sócios não trabalham nem a metade e ganham a mesma coisa, entrou a minha mulher na sala com o copo na mão, já posso mandar servir o jantar?
A copeira servia à francesa, meus filhos tinham crescido, eu e a minha mulher estávamos gordos. É aquele vinho que você gosta, ela estalou a língua com prazer. Meu filho me pediu dinheiro quando estávamos no cafezinho, minha filha me pediu dinheiro na hora do licor. Minha mulher nada pediu, nós tínhamos conta bancária conjunta. Vamos dar uma volta de carro?, convidei. Eu sabia que ela não ia, era hora da novela. Não sei que graça você acha em passear de carro todas as noites, também aquele carro custou uma fortuna, tem que ser usado, eu é que cada vez me apego menos aos bens materiais, minha mulher respondeu.
Os carros dos meninos bloqueavam a porta da garagem, impedindo que eu tirasse o meu. Tirei os carros dos dois, botei na rua, tirei o meu, botei na rua, coloquei os dois carros novamente na garagem, fechei a porta, essas manobras todas me deixaram levemente irritado, mas ao ver os parachoques salientes do meu carro, o reforço especial duplo de aço cromado, senti o coração bater apressado de euforia. Enfiei a chave na ignição, era um motor poderoso que gerava a sua força em silêncio, escondido no capô aerodinâmico. Saí, como sempre sem saber para onde ir, tinha que ser uma rua deserta, nesta cidade que tem mais gente do que moscas. Na avenida Brasil, ali não podia ser, muito movimento. Cheguei numa rua mal iluminada, cheia de árvores escuras, o lugar ideal. Homem ou mulher? Realmente não fazia grande diferença, mas não aparecia ninguém em condições, comecei a ficar tenso, isso sempre acontecia, eu até gostava, o alívio era maior. Então vi a mulher, podia ser ela, ainda que mulher fosse menos emocionante, por ser mais fácil. Ela caminhava apressadamente, carregando um embrulho de papel ordinário, coisas de padaria ou de quitanda, estava de saia e blusa, andava depressa, havia árvores na calçada, de vinte em vinte metros, um interessante problema a exigir uma grande dose de perícia. Apaguei as luzes do carro e acelerei. Ela só percebeu que eu ia para cima dela quando ouviu o som da borracha dos pneus batendo no meio-fio. Peguei a mulher acima dos joelhos, bem no meio das duas pernas, um pouco mais sobre a esquerda, um golpe perfeito, ouvi o barulho do impacto partindo os dois ossões, dei uma guinada rápida para a esquerda, passei como um foguete rente a uma das árvores e deslizei com os pneus cantando, de volta para o asfalto. Motor bom, o meu, ia de zero a cem quilômetros em nove segundos. Ainda deu para ver que o corpo todo desengonçado da mulher havia ido parar, colorido de sangue, em cima de um muro, desses baixinhos de casa de subúrbio.
Examinei o carro na garagem. Corri orgulhosamente a mão de leve pelos paralamas, os parachoques sem marca. Poucas pessoas, no mundo inteiro, igualavam a minha habilidade no uso daquelas máquinas.
A família estava vendo televisão. Deu a sua voltinha, agora está mais calmo?, perguntou minha mulher, deitada no sofá, olhando fixamente o vídeo. Vou dormir, boa noite para todos, respondi, amanhã vou ter um dia terrível na companhia” (FONSECA, Rubem. Passeio noturno. In: ______. 64 contos de Rubem Fonseca. São Paulo: Cia das Letras, 2004).
O autor mineiro Rubem Fonseca é considerado um dos mestres na arte do conto. Sua obra contística, em grande parte, retrata a temática da violência e do isolamento do indivíduo no cenário urbano. O conto em análise, “Passeio noturno”, é um dos mais famosos dessa safra. A partir da leitura deste conto, podemos dizer que a narrativa provoca um efeito de choque no leitor, que é devido principalmente:
a) à geração do efeito de surpresa por percebermos que o personagem é casado e pai de família.
b) à geração de suspense que, em grande parte da narrativa, nos leva a crer que o personagem tem outro intento, diferente de atropelar e matar pessoas.
c) ao desinteresse apresentado pela mulher do personagem em relação às atividades noturnas do marido.
d) à percepção do fato de que se trata de um personagem de meia idade e pertencente a uma classe social favorecida economicamente.
e) à percepção de que a violência urbana é um problema grave, mas que tende a permanecer impune perante à indiferença do indivíduo na atualidade.

RESPOSTA: B. O efeito de choque no leitor se dá por causa do suspense gerado no decorrer da narrativa que leva a pensar que o personagem tem outros objetivos não violentos, e que não, necessariamente, pretende atropelar cidadãos e matá-los.

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